Corre entre os economistas mainstream a piada de que, desde 2008, os austríacos preveem 12 em cada 3 recessões. São tão pessimistas que sem querer acertam, mas apenas na razão de 1:4. Mesmo aqueles da mais conservadora Escola de Chicago acreditam que os sinais do mercado nos últimos 16 anos indicam que a China ainda vai muito bem, obrigado, que a política de juros negativos dos EUA já terminou e que os atuais juros estabelecidos pelo FED, entre 4 e 5%, já estão servindo para corrigir as distorções anteriores. Quando vemos o patrimônio da NVIDEA saltar de 350 milhões para quase um trilhão de dólares apenas em 2023, estamos vendo dados reais de crescimento na Economia e não a recessão global esperada pelos economistas austríacos. O problema desse tipo de análise é que o exponencial valor de uso das tecnologias mascara os perversos indicadores de desajustes com a crescente expansão da base monetária. A 50 anos, desde Breton Woods, parece mesmo que as teses da livre iniciativa e do ideal de livre competição da própria moeda foram inteiramente contrariados pelo controle da emissão de dólar pelo FED. Até a recessão do COVID teria sido “amenizada” pela emissão de U$ 5 trilhões pelo governo Bidem.
O que não esclarecem é que a conta foi paga pelos pagadores de impostos de todo o mundo. O efeito foi diluído em 200 países e a perda de poder aquisitivo amenizada pelo incremento das tecnologias, do uso da I.A. ao agronegócio, a campo. Há um trade off entre a onerosidade de uso de recursos e o valor agregado dos produtos finais numa cadeia produtiva. Enquanto os agricultores europeus amargam custos exorbitantes de certificação e monitoramento de produção sustentável, a China segue crescendo totalmente indiferente a leis ambientais draconianas, na agricultura e na indústria. Em paralelo, há um trade off entre a volatilidade dos bens de consumo e o marketing de vendas. Nestes quatro parâmetros, entre outros, temos um arranjo de equilíbrio. As empresas privadas usam dos indicadores socias e econômicos para direcionar seus investimentos e coordenar o uso de seus ativos. Empresas como o Tik Tok manipulam dados de marketing para empurrar valores de utilidade que em situações normais não seriam aceitos pelos pais de família, mas são inocentemente absorvidos por jovens numa lógica inteiramente consumista. O truque parece estar dando certo, mas até quando?
Trata-se de um falso equilíbrio, o consumismo segue na onda da volatilidade da moeda fiduciária, das moedas Fiat. Para que poupar se seu valor será menor amanhã? Ocorre que a tese das preferências temporais e contingentes e da reserva de valor mais perene dos austríacos não foi revogada. O que temos é um desarranjo monumental entre dependência e independência dos favores e das esmolas pelo Estado. Muito conveniente a políticos e redes monopolistas.
Em entrevista muito recente no canal Market Makers (I), Fernando Urcich sugeriu que a China ainda tem muito fôlego para crescer, mas seu regime centralizado artificialmente gera oferta de bens onde não há demanda potencial. Foi o caso das sua cidades fantasmas. A aparência de solidez do mercado imobiliário gera uma falsa sensação de que este bem fixo seria o suprassumo de Reserva de Valor na sociedade. A sobrevalorização decorre do baixo entendimento de que muitos se refugiam nisso por descrença nos ativos de maior potencial, afinal, os impostos e a depreciação da moeda tendem a oprimir os ganhos reais de patrimônio líquido: a operação ganha-ganha da verdadeira geração de riqueza.
Pelo menos potencialmente, o Bitcoin pode reverter este estado de coisas. Já teve gente que vendeu automóvel e casa para compra esta moeda e se deu bem. Claro que com sua volatilidade uma recomendação dessa é temerária aos cidadãos normais, que não tem tempo para sondar riscos e momentos certos de entrada e saída deste mercado monetário extra oficial. Ocorre que para os austríacos, a recessão não é necessariamente um evento sinistro, a ser evitado a todo custo. O custo de se instigar crescimento artificialmente é que muitos sinais positivos hoje vão se tornar negativos a não muito longo prazo. Investimentos sérios, de maior potencial, levam 5 a 10 anos para terem seu retorno. Na recessão, os maus investimentos, os que apostaram num mero desejo de consumo, por exemplo, serão eliminados. Há como que uma limpeza no uso de recursos escasso e na preferência temporal das famílias como um todo. O que eu aposto é no redirecionamento àquelas que apostam no futuro; entre outros, a aposta na educação de valor perene.
Teria o Bitcoin um sinal outlier de que ainda valesse a pena poupar, mesmo que tenhamos que esperar a passagem de um longo ciclo de recessão? Faz parte da educação financeira entender princípios, e não jogos de ganha-perde. O dólar continua firme à custa de todas as outras moedas. Mas a saída da Rússia no sistema SWIFT mostra que alguma coisa está mudando. Com o esgotamento de imóveis nas metrópoles, em não poucas, o aluguel pode ser mais compensatório que a imobilização de grande capital numa família de classe média, por exemplo. Falando nisso, o capital “imobilizado” em bitcoins já preocupa os monopolistas de plantão. É dinheiro fora do sistema de tributação e dos juros inflacionários. Dizem que pode ultrapassar as reservas em ouro depositadas nos Banco Centrais de todo mundo.
Em todo caso, ler sinais dos tempos é mais que ler sinais econômicos o que exige, mais que nunca, visão de mundo, conhecimento cuidadosamente elaborado e ordenado, a fuga das ideologias de plantão, instigadas pelos políticos, governos e monopolistas globais. A onerosidade mais fixa, em estudos concentrados de 4, 8 ou 16 anos, tem um trade off com a volatilidade do excesso de informações diuturnas que se despeja na internet. Simulações de metaverso por I.A. embaralham a própria utilidade de seu uso mais perene.
Em meu sucinto livro O que é Bitcoin, uma visão interdisciplinar (2024, 70 p.), procuro motivar o início dessa longa jornada do conhecimento. Entender como se dá, em tese, a dialética entre valores de uso e de troca, em contextos fixos e variáveis das preferência temporais, é apenas um dos desafios outliers da educação financeira. Na prática, num ideal de 16 anos de estudos, é a experiência de interpretação de signos e símbolos – do ponto-signo aos arco dos significados – o que vai se fazer nos revelar os caminhos a seguir. Válido em todos os domínios dos saberes.
(I) https://youtu.be/OQuA6J9nmvo?si=oJnjvo2Zz2Geq2M_