Eu a vi pela primeira vez em São Paulo durante aqueles certames literários da Nestlé, creio pelos idos de 93. Do programa constavam palestras de Lygia e outras à época luminares das letras — Clarice Lispector, Nélida Piñon, João Antônio, Carlos Heitor Cony, Luís Fenando Veríssimo, Ignácio de Loyola Brandão, Lya Luft, Ana Paula Machado e que tais.
Terminada a jornada, concluída o programa, dá-se a corrida dos repórteres e fãs, à busca da palavra dos escritores. E a mais assediada foi Lygia, ao redor de quem as pessoas acorriam, pressurosas para obter uma palavra a respeito do certame, inclusive eu mesmo que queria obsequiar-lhe com exemplar da revista Lavra, Ideias & Letras, que, à época, editava em Brasília. Ansiava por uma palavra da autora dos livros As Meninas e Ciranda de Pedra, então grandes sucessos livrescos.
De longe, eu aguardava que a aglomeração em torno dela arrefecesse e então pudesse trocar umas palavras com ela. Então vi que Lygia me olhou, ao ver-me afastado, adivinhando que eu quisesse falar-lhe. Respondi olhando-a, como que auscultando lhe a angústia. Enfim, pude falar-lhe, entregar-lhe exemplar da revista, a que ela me atendeu com quase doçura, sorridente, educadamente. A lembrança do episódio ficou-me gravado até hoje, tantos anos são passados —- o seu olhar doce, o sorriso límpido, inteligente.
Agora nestes nossos velhos tempos pandêmicos, o mundo sob trâmites de violência, o País no aguardo de novas eleições — a notícia me açoita o espírito — Lygia Fagundes Telles faleceu no dia 3.4.22, domingo, aos 98 anos. Havia poucos dias, vi seu retrato nas redes sociais, uma senhora idosa, não desfeita ainda dos traços de candura e beleza. Lygia Fagundes Telles foi uma das maiores escritoras do País. Obteve os mais importantes prêmios literários, inclusive o mais prestigiado galardão de letras do mundo lusófono — o Camões, pelo conjunto de suas obras. Também foi a primeira escritora brasileira indicada para o Nobel de literatura.
Não há negar — nosso País acaba de perder uma das suas maiores representantes literárias, sem falar que o destino, sempre cruel, nos deixa órfãos de uma figura humana educada e culta, Lygia Fagundes Telles. Que sua alma, na medida de seus ideais intrínsecos que representam suas obras sirvam-lhe de escada em direção à morada celeste.
CDL/Bsb, 4.04.22
Foto: Lydia Telles – Reprodução: Estadão